Presidente da Comissão de Governança, Transparência e Controle Social da Câmara Legislativa do Distrito Federal, o deputado Joe Valle terá mais uma missão: ele vai coordenar a Frente Parlamentar pela Melhoria e Fortalecimento da Gestão Pública do DF, que será instalada em fevereiro. Joe Carlo Viana Valle nasceu em Caicó/RN, em 2 de setembro de 1964, mas mora em Brasília há 42 anos. Engenheiro Florestal e empresário da área agrícola, presidiu a Emater-DF e foi secretário de Inclusão Social do Ministério e Tecnologia. Pelo PSB, foi eleito deputado na Câmara Legislativa em 2010 com mais de 13 mil votos. Atualmente é o terceiro secretário da Casa, titular da Comissão de Constituição e Justiça e campeão de leis sancionadas pelo Governo do Distrito Federal. Desde o início do mandato, ele divulga seus gastos no Portal da Transparência.
Joe Valle diz que os governos normalmente são muito fracos em gestão, pois não conseguem enxergar o planejamento de longo prazo. “Posso contar nos dedos das mãos as cidades brasileiras que têm planejamento de longo prazo”, comenta. Segundo o deputado, a Frente Parlamentar pode justamente trabalhar na definição de políticas sustentáveis de gestão. Em entrevista à Revista Gestão Pública & Desenvolvimento, Joe Valle defende uma reforma política para que haja gestão pública eficiente.
Como a Frente Parlamentar pela Melhoria e Fortalecimento da Gestão Pública do DF poderá propor medidas práticas para a melhoria da gestão pública?
JOE VALLE – Primeiro faremos um nivelamento de gestão com a realização de encontros, seminários e reuniões, para que todos possam falar a mesma linguagem e entender a gestão pública como ferramenta básica para a qualidade de vida das pessoas. Segundo, vamos realizar um observatório de políticas públicas de gestão para que tenhamos um portfólio dentro da própria casa no intuito de municiar os parlamentares das ferramentas necessárias para se fazer uma boa fiscalização. Em terceiro lugar, estamos vendo as ferramentas que dispomos para melhorar a gestão dos gabinetes. Tudo isso, até chegarmos a leis estruturantes que auxiliem no processo de gestão. Estamos trabalhando também para transformar uma comissão temporária, a Comissão de Governança, Transparência e Controle Social, numa comissão permanente, para fortalecer a fiscalização desta casa. A frente tem um coordenador técnico que busca na sociedade organizada formar grupos de trabalho que promovam audiências públicas para que possamos discutir os projetos de lei de forma participativa.
Em outros estados existem frentes pela melhoria da gestão pública semelhantes a que está sendo criada no DF?
JOE VALLE – Não, a Comissão de Governança, Transparência e Controle Social, por exemplo, é pioneira, tem um formato diferenciado, além de fiscalizar é proativa no controle da gestão pública. Acredito que pelo formato e resultados já alcançados, ela se tornará um benchmarking na área de gestão e governança para o Legislativo nacional.
A atuação da frente do DF poderá ser comparada à da Frente Parlamentar Mista para o Fortalecimento da Gestão Pública?
JOE VALLE – Ela se caracteriza por ser uma extensão da Frente Parlamentar Mista porque estamos numa República Federativa e trabalhamos com nossos representantes federais que são do Estado na realidade. Esse link é salutar para que tenhamos um processo estadual paralelo ao federal, os dois se complementam para que não tenhamos desperdício de recursos e retrabalho. A tendência é que as frentes estaduais tenham menos recursos do que a federal, não só financeiros como de pessoal e outros.
O empresário Jorge Gerdau disse na abertura do Congresso Brasileiro de Gestão Municipal que a gestão pública representa 40% do PIB. O que isso significa?
JOE VALLE – É a mesma coisa do cidadão ter sua casa e de tudo de valor que tiver lá quarenta por cento ficarem num quarto. E aí, ele coloca uma pessoa desconectada, sem experiência nenhuma, para cuidar deste quarto repleto de obras de arte. Caricaturando, é mais ou menos neste sentido. Ou seja, quarenta por cento do PIB estão nas mãos de gestores públicos e 75% destes estão despreparados. É uma coisa impressionante. A gestão pública precisa ser bem mais eficaz. Alguns estudos mostram que a corrupção corrói o Estado brasileiro, 13% se tratam de corrupção ativa, aquela que lemos nos jornais, mensalões da vida. Mas 87% da corrupção passiva é por meio da má gestão dos recursos públicos. Se perde muito dinheiro neste país pela má gestão. Quando se consegue economizar estes 87% por meio de uma gestão eficiente, é possível dificultar enormemente a corrupção ativa, porque você tem informação do que está acontecendo. Não se consegue fazer gestão pública em curto prazo, um secretário de Estado faz uma campanha, quando entra na secretaria não tem dados, ele cria os quadros e o planejamento. Depois de dois anos, quando começa a realizar este planejamento, é trocado porque houve um acordo político, o que gera um gasto exagerado, é como rasgar notas de R$ 100. Isso se repete no país, um exemplo é o DF, que tem uma base muito larga de partidos. Fica quase impossível fazer gestão pública, é preciso ter uma reforma política para se ter uma reforma da gestão pública. Repito uma frase da ex-senadora Marina Silva: É preciso políticas de longo prazo para o curto prazo da política, quatro anos é um soluço mandatário.
Em quais aspectos o DF pode ser conhecido como precursor de ações positivas em gestão pública? Qual é o caminho para melhorar a gestão pública na capital do país?
JOE VALLE – A Lei da Responsabilidade Ativa da Comissão de Governança, Transparência e Controle Social foi aprovada este mês na Câmara Legislativa. Pela primeira vez, o Legislativo está trabalhando com uma fiscalização proativa na gestão. Ela obriga os gestores públicos, as secretarias e as instituições enviarem para a Câmara trimestralmente um caderno de gestão que faz o acompanhamento do programa de governo que foi entregue no primeiro momento em que o governante entrou. Este é um processo que leva o Executivo a se organizar em processos de gestão. Isso é uma coisa inovadora porque normalmente o Legislativo fiscaliza os incêndios, ou, então, fiscaliza para fazer oposição, mostrar os erros do governo. A gente acredita que isso é inovador e vai mudar a rotina, a forma de fazer gestão pública no DF.
Como o senhor pensa em atrair para o debate o Executivo e o Judiciário local e estender as discussões para a sociedade?
JOE VALLE – A Comissão de Governança e a Frente Parlamentar pela Melhoria e Fortalecimento da Gestão são o farol do Legislativo sobre o Executivo na questão da gestão. Como temos o Ministério Público, o Tribunal de Contas e aqui no DF uma Secretaria de Transparência, a Frente da Gestão e a Comissão de Governança serão este farol. Nós fomos ao Ministério Público, estamos agendados com o Tribunal de Contas e temos realizado seminários para discutir estas questões e as leis, trazendo o Executivo por meio da Secretaria de Transparência e os tribunais para discutir as leis e os cadernos de gestão.
E as entidades de classe e as universidades?
JOE VALLE – O modelo de Frente Parlamentar tem a tendência de por meio de um coordenador técnico criar grupos de trabalho com a participação de entidades de classe e universidades para debater os temas. Ela é uma geradora de informações para atender as demandas da sociedade. Numa sala de situação são geradas todas as informações necessárias para fazer a organização deste mandato. Por exemplo, todas as informações do meu mandato estão no portal da transparência acessível a qualquer pessoa. A ideia é que todas as instituições trabalhem neste modelo. A frente será extremamente participativa.
Como incentivar outras unidades da federação a trabalharem permanentemente por um novo modelo de gestão para o Brasil?
JOE VALLE – Eu participei de encontros de prefeitos promovidos pelo Partido Socialista Brasileiro (PSB). O partido cresceu muito, elegeu mais de 400 prefeitos, promoveu um seminário para troca de experiências. Participei também do Congresso Brasileiro de Gestão Municipal nos dias 12 e 13 de dezembro em Brasília. O que a gente percebe é que falta comunicação. Não existe um órgão central que trate da gestão pública, onde os prefeitos possam buscar ajuda. Por exemplo, aqui na Câmara Legislativa fui procurar um modelo de gabinete e não existia, pois não existe padronização. Não existem indicadores de eficiência, eficácia e efetividade. A gestão é uma grande ferramenta até para fazer uma campanha política. Os governadores mais bem avaliados são aqueles que fizeram a melhor gestão com ferramentas e tecnologia, um exemplo, o governador de Pernambuco, Eduardo Campos. O prefeito Márcio Lacerda de Belo Horizonte também é um exemplo de sucesso baseado em uma gestão eficiente. Considero a reforma política essencial para termos uma reforma da gestão pública.
Quais as principais propostas da frente para a gestão do DF?
JOE VALLE – A principal proposta é gerar informação, não consigo planejar se não tiver informação. Precisamos de uma empresa pública que cuide das informações. Tivemos recentemente o caso da Caixa de Pandora, onde a Codeplan foi entregue a outros fins, agora ela voltou a fazer o planejamento. Precisamos criar os planos de gestão, os mapas estratégicos de longo prazo. Não podemos fazer gestão para o curto prazo da política. Precisamos de políticos mais técnicos. A população precisa procurar nos seus candidatos também os gestores.
O senhor é campeão em projetos de lei sancionados pelo GDF, quais são os principais destaques na área de gestão?
JOE VALLE – A lei de Responsabilidade Ativa, a Comissão de Governança, Transparência e Controle Social e a Lei de Responsabilidade Educacional, que é um projeto de gestão. O governo precisa informar os índices de responsabilidade na educação. Os indicadores passam a ser obrigatoriamente divulgados e isso faz com que os gestores educacionais planejem suas ações: taxa de analfabetismo, número médio de estudantes por extratos etários, programas de alimentação escolar, oferta escolar, e outros.
O senhor é também coordenador da Frente Parlamentar de Mobilidade Sustentável. O que está sendo estudado para melhorar a mobilidade no DF?
JOE VALLE – Acompanhamos toda a legislação de transporte no Distrito Federal. A forma de trabalho é a mesma da Comissão de Governança, um coordenador técnico que forma grupos de trabalho temáticos para discutir os temas com a sociedade. Aí se formula textos que passam a tramitar na Câmara e se transformam em lei. Temos atuação no Plano Diretor de Transporte Urbano onde fizemos algumas emendas para buscar para os ônibus combustíveis mais alternativos e limpos. Outra atuação foi no sentido de construir ciclovias, para aumentar o uso das bicicletas para o lazer e trabalho dos moradores.
No portal da Transparência, o senhor divulga os gastos referentes ao seu mandato, qual a importância desta iniciativa. Outros parlamentares do DF seguem seu exemplo?
JOE VALLE – Nosso planejamento estratégico do mandato é inovador e tem sido exemplo para outros. Quando assumimos, nenhum mandato tinha o certificado ISO 9001. Eu quero é que copiem mesmo porque se eu conseguir sair com 24 mandatos certificados, isso será uma vitória. Um mandato que quer transformar Brasília numa cidade sustentável, se conseguir influenciar outros no sentido de melhorar sua gestão, transparência e controle social, será uma forma de transformar Brasília numa cidade sustentável. Criamos indicadores que avaliam o bom mandato, por exemplo, o custo por real fiscalizado, custo por lei aprovada, entre outros.
Fonte: Revista Gestão Pública